(Le Tango des Rashevski, Bélgica/Luxemburgo/França, 2003)
Uma família belga de origem judaica afastada, no entanto, das tradições até que a morte da matriarca, separada do marido, que virou rabino ortodoxo um tanto intolerante em Israel, leva vários de seus membros a ir em busca de suas raízes e, quando não, gera uma crise, ou várias crises, entre eles e os outros, envolvendo circuncisão, casamentos mistos (entre goyim e judeus, entre judeus e árabes), judaísmo liberal, judaísmo ortodoxo e, muita, mas muita discussão à maneira judaica e ao som de algum tango, que, segundo a lição da matriarca dos Rashevski, servia para varrer os problemas para longe, para o deserto de Negev, em Israel, cenário que abre e fecha este simpático filme do diretor Sam Garbarski. Drama e comédia, em que mais do que ser judeu, o importante é ser mensch ("ser humano", em iídiche, palavra relativamente fácil de definir, mas difícil de "sê-la" na prática), e buscar o entendimento, o conhecimento do outro, uma lição universal, ainda a ser aprendida pelos homens, judeus ou não. Belo filme, que complementa o que o recém-falecido poeta Bruno Tolentino disse uma vez numa entrevista, destacando o papel da alteridade, e muito pertinente nestes tempos esquizofrênicos em que as pessoas parecem se fechar sobre elas mesmas:
“O contato com o outro é essencial. É impossível não se relacionar, não levar em conta a realidade do outro. O outro é o real. Não sou eu nem o que eu quero. Se o seu esforço é todo por não se afastar da realidade, por servi-la, por ceder a ela cada vez mais, fatalmente você vai descobrir que essa realidade é o outro, a pessoa que está na sua frente. Ele existe. O resto é abstração. Você faz o que quiser com a sua imaginação. Mas o outro você não pode imaginar. Ele está sempre a mais ou a menos. Atrapalha. É uma droga. Realmente, seria melhor que não houvesse. Sem o outro, a vida seria muito mais fácil, mais simples, mais narcisística. Só que o outro não pode deixar de ser verdade. Não há alternativa. É por aqui ou nada. Mas tem gente apaixonada pelo nada, porque o nada te dispensa até mesmo de ser você. Aqui no nosso país nós nos acostumamos a atropelar o próximo como se ele nada fosse, em nome desse ou daquele ponto de vista, que na verdade não é outra coisa que não um ponto de vista. Não aceito de modo algum que a verdade seja tida como um ponto de vista pura e simplesmente, mas ela não pode prescindir do ponto de vista. Há um risco educativo em atropelar o próximo, impor uma seletividade. E é gravíssimo isso."
(Bruno Tolentino, no site: http://www.blogdogaleno.com.br)
2 comentários:
David
Quero agradecer de coração suas palavras no coment do Blog do Carlão mais as suas palavras dedicadas aqui no teu blog...Minha preocupação era que ali todos estavam parecendo filhos da puta, mas MArcelo V na montagem conseguiu colocar na personagem da Madalena, uma humanidade acima do normal.
Mais uma vez, agradeço pelas suas palavras, tão importantes para meu trabalho!
E como não conhecia seu trabalho, estou add seu blog ao meu!
Obrigado, Vébis. Fico contente de ter contribuído de alguma forma para o seu trabalho. Vou adicionar o seu blog também e apareça sempre por aqui. Um abraço.
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