(Chacun son Cinéma ou Ce Petit Coup au Coeur Quand la Lumière s'Éteint et que le Film Commence, França, 2007)
Cada com seu cinema ou cada um com seu futebol (no caso de Ken Loach), nesta coletânea de 33 curtas de três minutos cada, dirigidos por significativos cineastas consagrados, em homenagem aos 60 anos do pomposo Festival de Cannes e obviamente ao cinema em geral como arte, como lugar de exibição das grandes emoções, afetações, distúrbios psicossociais, lembranças e paixões afins, enfim, como celebração de uma trajetória pessoal. Cada curta com o estilo e, muitas vezes, com a cara de seu diretor, literalmente: o apocalipse de David Cronenberg (foto, um dos melhores); o humor bonachão do quase centenário Manoel de Oliveira, reinventando a História, com H maiúsculo; o niilismo nietzscheano de Lars Von Trier, aqui aplicando na prática a "filosofia do martelo" do bigodudo pensador alemão; o cinema e suas cortinas vermelhas como porta de entrada para o mundo de sonhos e, principalmente, de pesadelos de David Lynch; a comicidade dolorosa de Roman Polanski; o tipo excêntrico, rural e solitário de Takeshi Kitano; a nostalgia poética de Theo Angelopoulos, homenageando o 8 e 1/2 de Felllini; a nostalgia de butique de Claude Lelouch, homenageando os pais; o conhecido narcisismo de Youssef Chahine; o diário confessional e bem-humorado de Nanni Moretti, falando das idas ao cinema com os filhos; o cinema em tempos de guerra sem fim de Amos Gitai, tanto no passado como no presente, sobrepondo-se; o pai e filho de acento cockney à Ken Loach armando confusão na fila do cinema, decidindo-se entre o cinema e o jogo de futebol e irritando todo mundo, em outro bom segmento; os amores fetichistas feitos e desfeitos na sala escura, refúgio de solitários, de Wong Kar-Wai; o humor à Jacques Tati e crítico de Elia Suleiman; a sala de cinema como lugar de tolerância, de Billie August; o humanismo de Abbas Kiarostami, ao enquadrar somente o rosto e a reação de mulheres islâmicas comovidas diante da cena final de Romeu e Julieta, de Franco Zeffirelli, entre outros. Como era de se esperar, coletânea irregular, com alguns bons filmetes, outros nem tanto, como o de Walter Salles, que, apesar de engraçadinho e esforçado, é o mais "institucional" de todos, lembrando as propagandas e vinhetas do Governo Federal e seu apreço todo sentimental (e falso) a tipos populares, aqui representado pela simpática dupla de repentistas Caju e Castanha, e o de Jane Campion, com seu forçado simbolismo psicanalítico protofeminista, na estória de uma barata bailarina que é pisoteada num cinema. Ainda assim, um conjunto bastante agradável, em que se sobressai uma melancólica nostalgia em que o cinema, com suas grandes salas de milhares de poltronas, hoje decadentes ou fechadas, parecia ser de fato este tão nostálgico lugar de momentos inesquecíveis proporcionados por cineastas e atores míticos, como Bresson, Dreyer, Fellini, Mastroianni e Godard (escolhas óbvias até demais), algo, segundo quase todos os missivistas, aparentemente impossível de se vivenciar hoje em dia, sem se copiar, felizmente, o estilo lacrimoso, consagrado por Giuseppe Tornatore em Cinema Paradiso. Próximo projeto coletivo, já que os cinemas andam decadentes ou voltados demais para o consumo tipo multiplex: Cada Um com Seu YouTube!
5 comentários:
Vc escolheu uma foto muito melhor do que a que eu escolhi para ilustrar o post, hein!
Escolhi justamente para combinar com a foto do Kevin Bacon alucinado aqui embaixo. E também porque é o melhor de todos os segmentos.
Daria um empático técnico com o da tesoura dançando no cinema. hehehe
É ótimo também. Também, pudera, foi outro dirigido por um David, hehehe.
Muito obrigado por escrever isto, era incrivelmente informativo e disse-me uma tonelada
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