sexta-feira, março 07, 2008

Estamos Bem Mesmo Sem Você

(Anche Libero Va Bene, Itália, 2006)



Mesmo com alguns excessos, com um pé meio trêmulo fincado nos clássicos do neo-realismo da bota e outro, mais firme, no típico melodrama familiar à italiana, em que não faltarão lágrimas e ternura em seu comovente desfecho, o ator e estreante na direção Kim Rossi Stuart (A Chave de Casa, 2005) nos conduz com certa habilidade, através dos olhos tristes do menino Tommaso (Alessandro Morace, muito bem), ao dia-a-dia de uma família de classe média marcada pelo abandono rotineiro da mãe. Mesmo com a sentida ausência dela e mesmo alternando momentos de genuíno afeto com outros típicos de irritação e teimosia paternas, o pai (Stuart) consegue manter razoavelmente equilibrada a rotina familiar, enquanto trabalha como operador de steadycam em produções cinematográficas, tarefa que também exige equilíbrio, calma e habilidade. Ou seja, estão todos bem mesmo sem ela. No entanto, a mãe, um tipo emocionalmente desequilibrado, reaparece do nada, e o pai, um trouxa ainda apaixonado, a perdoa (mais uma vez). Mas Tommaso, que quer ser atacante de futebol do time da escola, sabe que isso não é para sempre, e o fantasma de um novo abandono acaba por se impor a todos e traduz-se em instabilidade à recém-reunida família, principalmente a seu irritadiço pai, sendo que o garoto é o que mais sofre neste processo cíclico de retorno/abandono e assim amadurece mais do que todo mundo, tendo a certeza de que os afetos que um dia pareciam estáveis, longos, terminam por solapar diante da onipresente ameaça da ausência, da perda. Se, no ninho da infância, acreditava na idéia de um lar como uma fortaleza contra as incertezas do mundo, seu olhar, com a passagem do tempo e mais maduro, traduz-se depois em angústia e resignação diante do despedaçamento familiar, ainda que não deixe de se agarrar ao que resta do teimoso afeto paterno e assim seguir em frente, só que agora como "líbero" (defensor), de acordo com a insistência paterna e com o título original do filme. Mas, para o conformado garoto, se for manter os cacos do que restou da família reunidos, "va bene" (está bom) assim mesmo.

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