quinta-feira, março 27, 2008

Chega de Saudade

(Brasil, 2007)



Numa única noite num clube de dança em São Paulo, pessoas de várias gerações se encantam, se enamoram, se desencantam, embalados por antigos sucessos do passado, nas vozes de Elza Soares e Marku Ribas. Há os que dançam com todas (Stepan Nercessian), há quem invoque com quem dança com todas (Cássia Kiss). Há o gordinho suado com quem ninguém quer dançar. Há quem quer dançar e não consegue companhia (Betty Faria). Há quem lamente já não poder dançar (Leonardo Villar) e que briga com a sua companhia (Tonia Carrero). Há ainda, dentre os da geração mais nova, a namorada (Maria Flor) do DJ (Paulo Vilhena) que se deixa embalar nos braços daquele da velha guarda que dança com todas, para desespero de seu jovem e irritadiço parceiro, que, por ciúmes, quase arruína com o ritmo da noite. No meio de tudo, um garçom serve a todos e a todos observa.

No salão de dança, entre o compasso dos passos e o descompasso dos sentimentos, entre o brilho do passado e a desilusão do presente, olhares são trocados, olhares são correspondidos, amantes que mal se conhecem roçam pernas na escuridão e num ritmo próprio, bilhetes vão e vêm de mesa em mesa e amores desfeitos são refeitos com poesia e paçoca. Outros talvez jamais se refaçam. Entre pernas e mãos que balançam e quadris que chacoalham, Laís Bodansky (O Bicho de Sete Cabeças), recorrendo a O Jantar, de Ettore Scola, e a Altman, só que com mais doçura, nos presenteia com uma crônica sensível e agradável sobre os velhos tempos nestes novos e efêmeros tempos, sem se deixar levar por uma nostalgia embolorada, típica de um filme como a do argentino Clube da Lua, e sem forçar na poesia, que surge espontânea dos lábios (e da lábia malandra também) do Eudes de Stepan Nercessian, o personagem que melhor sabe viver o “encanto do momento”, e faz este filme coral caminhar com muita desenvoltura e em tempo quase real entre os vários freqüentadores do baile, graças sobretudo à câmera fluida de Walter Carvalho que, felizmente, evita aqui o seu conhecido pendor para maneirismos e embelezamento vazio de outros trabalhos, como Amarelo Manga, encarregando-se de registrar pés, tatuagens, braços e sobretudo rostos enrugados dos participantes com a necessária melancolia e algum despojamento. Além, é claro, da montagem de Paulo Sacramento (O Prisioneiro da Grade de Ferro), que se encarrega de embalar o bom ritmo do filme na cadência das danças e da prosa, do samba, do tango, etc., dos personagens.

6 comentários:

Anónimo disse...

O Jantar ou o Baile?

Se bem q O Baile é de fato, bem diferente. hehehe

Lorde David disse...

Eu achei mais para O Jantar, Daniel. Em O Baile, ninguém falava nada. Neste, todo mundo fala pra caramba, hehehe. E O Baile se estendia por décadas. Este só por uma noite.

Ailton Monteiro disse...

Tanto O JANTAR quanto O BAILE, pelo que eu li, foram influências para o filme. Eu achei o trailer simpático.

André Renato disse...

Boa resenha! Este filme é pérola rara no cinema nacional!

Anónimo disse...

Ao contrario de muitos brasileiros, sou grande simpatizante do cinema nacional. Acho que tem filmes horriveis e de pessima qualidade, mas temos de valorizar os bons. Ainda nao vi, mas com certeza esta na minha listinha.

Lorde David disse...

Isabela, o cinema nacional realmente tem coisas muito ruins, como o recente O Magnata. Mas de vez em quando surgem alguns filmes simpáticos que valem uma olhada, como este. Como bem definiu o André, uma peróla rara, que se vê com prazer e alguma nostagia.