terça-feira, abril 03, 2007

Crimes e Pecados

(Crimes and Misdemeanors, EUA, 1989)



As contravenções ou transgressões (misdemeanors) comuns a qualquer ser humano diante do adultério, que levará o crime e depois a culpa ao respeitável oftalmologista Doutor Judah Rosenthal (Martin Lanadau), que sofre para romper com a amante obsessiva, interpretada por Anjelica Huston e que depois de anos de affair decide contar tudo para a esposa de Judah (Claire Bloom) e chantageá-lo, para desespero dele, que não vê outra saída a não ser eliminá-la, com a ajuda do irmão mafioso (Jerry Orbach). Torce-se por ele, mas torce-se também para que o diretor de documentários Cliff Stern (Woody Allen), com o casamento em crise, seja correspondido pela produtora Halley Reed (Mia Farrow), que a conhece enquanto filma, para ganhar algum dinheiro e completar seu projeto pessoal, um documentário sobre o egocêntrico produtor de televisão (e cunhado) Lester (Alan Alda), em duas histórias que correm paralelas, mas que se convergem num final melancólico, neste filme levado com rigor demonstrativo e sobriedade por Woody Allen. Rigor, sobretudo, nos enquadramentos, destacando a onipresença do olhar, e nos temas filosoficamente debatidos ao longo do filme, pontuado por vários questionamentos morais apenas para descambar na dúvida e na incerteza que cobrem o universo, que parece escapar o tempo todo de qualquer compreensão mais analítica aos nossos próprios olhos. Destaca, sobretudo, a indiferença desse universo diante das aflições humanas e confronta-a com a certeza amarga, entre outras coisas, de que a pessoa com quem se compartilha afinidades certamente e misteriosamente não será a pessoa que ficará ao seu lado no final das contas, como demonstrado na cena da festa, no desenlace, onde muitos se divertem, enquanto um se recolhe, triste, no canto escuro, longe de todos. A vida é um mistério e um saco, às vezes, mas nela há alguns pequenos prazeres, como ir ao cinema à tarde, durante o horário de trabalho, essa sim uma deliciosa transgressão e que daria sentido vez ou outra a esse universo indiferente. Um extraordinário filme de Woody Allen, menos engraçado do que muitos poderiam imaginar, embora o humor marque presença aqui e ali, de modo agridoce, tchecoviano principalmente.

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