quinta-feira, dezembro 21, 2006

Pistoleiros do Entardecer

(Ride the High Country, EUA, 1962)

Sam Peckinpah ficaria conhecido pelo parcial rótulo de cineasta da violência, em filmes como Meu Ódio Será Tua Herança (69), Sob o Domínio do Medo (71), Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia (74) e A Cruz de Ferro (76). Filmava mortes e tiroteios com o ostensivo uso da câmera lenta. Mas antes este belíssimo western sobre o fim do gênero, reunindo em seu elenco dois de seus maiores ícones: Randolph Scott (em seu último filme) e Joel McCrea.

McCrea é ex-homem da lei Steve Judd contratado para transportar uma remessa de ouro em território hostil. Num mundo que se moderniza, xerifes a cavalo como ele são tipos raros, ultrapassados pelos automóveis, que fazem questão de cortar seu caminho, em momento-chave logo no início do filme. Pobre, com as mangas puídas e os sinais do tempo impressos no rosto, ainda assim mantém a dignidade num lugar onde todos parecem desdenhar de seu tipo antiquado. Para escoltá-lo na tarefa de alto risco, contrata um antigo conhecido, Gil Westrum (Randolph Scott), também um caubói do passado que hoje sobrevive como atração de um parque de diversões. Junta-se a eles o jovem intempestivo Heck Longtre (Ron Starr), protegido de Gil. Porém, o que não passa pela cabeça de Judd é que Gil, velho pilantra, e Heck pretendem roubar o ouro.

No caminho, une-se a eles a jovem Elsa Knudsen (Mariette Hartley), que decide acompanhá-los para poder escapar do seu rígido pai, Joshua Knudsen (R.G. Armstrong), um pregador religioso, e se casar com Billy Hammond (James Drury), um mineiro nada religioso, no garimpo de Ouro Bruto. Após a cerimônia, feita num bordel, em meio a rudes mineradores e por um juiz de paz para lá de bêbado, Elsa percebe o equívoco cometido, pois Bill é um homem violento e seus irmãos, mais ainda. Assim, Gil dá um jeito para que o matrimônio seja considerado nulo e os quatro saem dali. No caminho, Judd descobre a traição, uma de suas maiores decepções na vida, mas evita o roubo e prende os dois. No entanto, Bill e seus irmãos os perseguem, pois querem Elsa de volta a qualquer custo, o que desembocará no tiroteio final que unirá novamente Gil e Judd.

Peckinpah, em seu segundo filme para o cinema, pavimenta aqui a trilha do western crepuscular que marcaria outros de seus trabalhos, especialmente Meu Ódio..., A Morte não Manda Recado (70), Junior Bonner (72) e Pat Garrett e Billy The Kid (73). Mas sem a violência do primeiro. Tudo é conduzido de maneira clássica, como nos westerns dos anos 50, cuja era de ouro parecia mesmo chegar ao fim, apesar do revival do gênero na Europa e seus erzätze mais estilizados. O melhor do filme são as conversas entre Judd e Gil durante a viagem, em que relembram o passado em comum com humor e certa dose de melancolia, o que imprime ao trajeto um tom memento mori (“lembre-se de que vai morrer”). Ao final, no entardecer do feliz título brasileiro, tombam os ícones, num fecho poético dos mais belos da história do cinema.

1 comentário:

Anónimo disse...

sam peckinpah forever
..a beleza do final de "pistoleiros.." é liricamente trágico,me faz lembrar do belíssimo desfecho pincelado pela poesia do fracasso de john huston em "asphalt jungle"(o segredo das jóias)e do duelo final entre gary cooper e burt lancaster em "vera cruz" de robert aldricht...alex