quinta-feira, dezembro 14, 2006

Filhos da Esperança (Children of Men, Reino Unido/EUA, 2006)

No lugar de um mundo dominado pela utopia tecnológica, Alfonso Cuarón cria, nesta adaptação da obra de P.D. James, uma visão futurista da humanidade bem mais convincente, por ser próxima à realidade dos dias de hoje. Ou seja, mergulhada em colapso e escassez onipresentes, da mesma forma que Richard Fleischer concebera para a Nova Iorque de No Mundo de 2020 (1973). Mas aqui, em vez da Nova Iorque superpovoada, uma Londres esvaziada. O motivo: há 18 anos não se registra o nascimento de uma única criança. Por isso, o mundo mergulha em caos social e as nações desmoronam. O Reino Unido, graças a um governo totalitário e repressor, é o único lugar que resiste, mesmo sacudido por atentados ou sitiado por milhares de imigrantes, não somente árabes, africanos ou russos, mas também alemães, muitos alemães, e que são mantidos enjaulados ou impedidos por cercas de entrar na ilha. Uma imigrante ou Fúgi, no entanto, aparece milagrosamente grávida e é protegida por uma organização extremista, The Fishes, liderada por Julian (Julianne Moore). O burocrata Theo Faron (Clive Owen), ex-ativista e ex-marido de Julian, após seqüestro, é pago para escoltar a grávida Kee (Clare-Hope Ashitey) até o litoral, onde ela embarcaria no navio Tomorrow (êta nominho óbvio!) de um tal “The Human Project”, cuja existência pouco se sabe a respeito, mas que representaria uma esperança para a (re)fertilização da humanidade.

Nesse périplo, apesar de passadas em 2027, várias cenas evocam a nossa época, como Guantánamo ou detenções em massa de imigrantes na fronteira dos Estados Unidos, por exemplo, e a deterioração urbana característica de cidades como México, São Paulo, Calcutá e outros “paraísos”. Mas evita, ao menos, o discurso panfletário. A câmera de Cuarón, em longos planos-seqüência, num notável trabalho de fotografia de Emmanuel Lubezcki, limita-se tão somente a mostrar esses bolsões de caos, onde nem o governo, nem os radicais parecem saber o que fazer para lidar com a situação, apelando sempre para as armas e para a matança.

Apesar do detestável subtexto “riponga” percorrendo a história, contrário ao que P.D. James teria imaginado (na verdade uma alegoria cristã), o filme, enxuto e tenso, prende a atenção, especialmente na cena da perseguição da moto ao carro, vista inteiramente de dentro do carro. E também, ponto alto do filme, a longa seqüência de tiroteio, com a câmera de mão acompanhando Theo e Kee fugindo do fogo cruzado.

Mesmo com o otimismo sinalizado e exaltado pela gravidez de Kee, ao final, o desfecho é um tanto incerto, parece dizer o diretor. Pouco se sabe se a humanidade terá sobrevida, pois o filme termina distanciado e envolto em densas névoas de incerteza, literalmente.

3 comentários:

Anónimo disse...

Esse filme teve pra mim o mesmo impacto de "O Resgate do Soldado Ryan". Sensacionais cenas de ação e no meio delas uma história que nunca chega a me comover.

Lorde David disse...

O Resgate do Soldado Ryan me comoveu mais. Ainda assim, o trabalho de Cuarón é bem interessante.

Michel Simões disse...

Ainda estou querendo ver esse filme!!!