sexta-feira, março 09, 2007

Os Budas Gigantes

(The Giant Buddhas, Alemanha, 2005)



Uma civilização se constrói sobre as ruínas de outra civilização. Mas no Afeganistão há tempos não há mais civilização, só ruínas, e uma população que sobrevive em meio aos escombros e despojos de cidades arruinadas por décadas de guerras e conflitos. O que restava de vestígios de outra civilização, na forma das gigantes estátuas de Budas, esculpidas em nichos nas montanhas de Bamyiam, o antigo regime do talibã tratou de pôr abaixo em 2001, ignorando os apelos de especialistas da ONU, da Unesco e de autoridades dos EUA e da União Européia, como mostra este documentário que retoma o infame episódio. Alguns viram na destruição dessas milenares obras, cujos “olhos de rubi lampejavam à noite” e que desde a Antigüidade encantavam os viajantes e peregrinos que seguiam pela Rota da Seda, como um grito de apelo às potências, vindo de um regime cada vez mais isolado e esquecido pelo mundo. Outros, pura barbárie de um governo fundamentalista islâmico, essencialmente iconoclasta em seu monoteísmo radical, que impunha os mais severos costumes às mulheres, sobretudo, jogando o país numa era de obscurantismo, ao mesmo tempo em que dava abrigo à organização terrorista Al-Qaeda, responsável por outro atentado iconoclasta poucos meses depois, ao derrubar as torres do World Trade Center, no fatídico 11 de setembro de Nova Iorque.

Neste contemplativo documentário, nem tanto sobre o budismo e dirigido com placidez por Christian Frei, que prefere se ater a impressões de antigos relatos, digressões, depoimentos e imagens de arquivo bem utilizadas, que a uma narração ostensivamente didática, algo comum nesse tipo de produção, faz-se arqueologia dos fragmentos perdidos e interliga-os a culturas e pessoas que de alguma forma entrelaçavam-se à história das estátuas, num trabalho de escavação e reconstrução. O resultado, ao mesmo tempo em que tenta entender as razões e motivações dos talibãs e da cultura islâmica para a destruição, é também um lamento silencioso, ao som de Philip Glass, ele mesmo budista, sobre a facilidade com que as civilizações, pilhadas, são reduzidas ao pó. O que resta, depois, é recolhido em cacos e fragmentos de escavações arqueológicas, às vezes remontados ou reconstruídos por meio de reproduções computadorizadas ou para servir de referência para simulacros popularescos erguidos como atrações de parques, como o Buda erguido na China, cópia da estátua afegã destruída, e cujas obras acabaram arruinando outro sítio arqueológico nas proximidades. Ou então desaparecem para sempre, restando apenas a memória ou registros de relatos que um dia deixarão de existir também.

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