(The Giant Buddhas, Alemanha, 2005)
Uma civilização se constrói sobre as ruínas de outra civilização. Mas no Afeganistão há tempos não há mais civilização, só ruínas, e uma população que sobrevive em meio aos escombros e despojos de cidades arruinadas por décadas de guerras e conflitos. O que restava de vestígios de outra civilização, na forma das gigantes estátuas de Budas, esculpidas em nichos nas montanhas de Bamyiam, o antigo regime do talibã tratou de pôr abaixo em 2001, ignorando os apelos de especialistas da ONU, da Unesco e de autoridades dos EUA e da União Européia, como mostra este documentário que retoma o infame episódio. Alguns viram na destruição dessas milenares obras, cujos “olhos de rubi lampejavam à noite” e que desde a Antigüidade encantavam os viajantes e peregrinos que seguiam pela Rota da Seda, como um grito de apelo às potências, vindo de um regime cada vez mais isolado e esquecido pelo mundo. Outros, pura barbárie de um governo fundamentalista islâmico, essencialmente iconoclasta em seu monoteísmo radical, que impunha os mais severos costumes às mulheres, sobretudo, jogando o país numa era de obscurantismo, ao mesmo tempo em que dava abrigo à organização terrorista Al-Qaeda, responsável por outro atentado iconoclasta poucos meses depois, ao derrubar as torres do World Trade Center, no fatídico 11 de setembro de Nova Iorque.
Neste contemplativo documentário, nem tanto sobre o budismo e dirigido com placidez por Christian Frei, que prefere se ater a impressões de antigos relatos, digressões, depoimentos e imagens de arquivo bem utilizadas, que a uma narração ostensivamente didática, algo comum nesse tipo de produção, faz-se arqueologia dos fragmentos perdidos e interliga-os a culturas e pessoas que de alguma forma entrelaçavam-se à história das estátuas, num trabalho de escavação e reconstrução. O resultado, ao mesmo tempo em que tenta entender as razões e motivações dos talibãs e da cultura islâmica para a destruição, é também um lamento silencioso, ao som de Philip Glass, ele mesmo budista, sobre a facilidade com que as civilizações, pilhadas, são reduzidas ao pó. O que resta, depois, é recolhido em cacos e fragmentos de escavações arqueológicas, às vezes remontados ou reconstruídos por meio de reproduções computadorizadas ou para servir de referência para simulacros popularescos erguidos como atrações de parques, como o Buda erguido na China, cópia da estátua afegã destruída, e cujas obras acabaram arruinando outro sítio arqueológico nas proximidades. Ou então desaparecem para sempre, restando apenas a memória ou registros de relatos que um dia deixarão de existir também.
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