sexta-feira, setembro 28, 2007

Irina Palm

(Reino Unido/Luxemburgo/Bélgica/Alemanha/França, 2006)



Relativo sucesso na França em sua modesta escala, superando nas bilheterias gaulesas até o excelente Death Proof de Quentin Tarantino, esta co-produção européia ambientada no Reino Unido e dirigida pelo alemão radicado na Bélgica Sam Garbarski, cujo penúltimo e ótimo filme, o belga-luxemburguês falado em francês (e em hebraico e iídiche e árabe também) O Tango de Rashevski (quanta nacionalidade, mein Gott!), fez também surpreendente sucesso nos cinemas daqui da terra da esquistossomose e da cachaça governamental, é estrelada pela roqueira inglesa Marianne Faithfull, numa interpretação contida, cheia de nuances. Aqui, ela vive a viúva Irina, uma senhora de idade da classe proletária inglesa, que, precisando urgente de dinheiro para o tratamento na Austrália do neto que sofre de uma doença rara, passa a masturbar homens por dinheiro numa casa de “tolerância” de Londres sem nunca vê-los, já que os respeitáveis senhores enfiam anonimamente seus membros por um buraco, e que vira a sensação do inferninho local, ganhando até a gloriosa alcunha de “Irina Palm”, gerando filas e filas e, principalmente, rancores. Ou seja, entrega-se de corpo e alma, de corpo, sobretudo, dando a mão à “palmatória”, a um ofício nada mais do que “braçal”, embora muito mal-visto por todos.

Em certo momento, o filho chato dela, a inveja de uma outra especialista em “hand job”, passada para trás por causa do inesperado sucesso de Irina, e as dores freqüentes ocasionadas por lesão por esforço repetitivo (no filme, conhecida como “Penis Elbow”, num trocadilho jocoso com “Tennis Elbow”) ameaçam o seu reinado. Apesar disso e da situação degradante em que se vê envolvida no dia-a-dia, o filme flui bem e segue britanicamente bem-humorado em suas tiradas, sem sucumbir ao escracho deslavado do tipo O Barato de Grace ou Full Monty ou resvalar no moralismo ou na polêmica pela polêmica, apesar de alguns surtos melodramáticos do filho de Irina (Kevin Bishop), quando ele descobre onde a sua mãezinha andou “metendo” a mão para salvar o neto. A naturalidade com que uma situação dessas vai se impondo deve-se muito, por que não, à boa “mão” do diretor Garbarski, à neutralidade com que filma, concentrando-se somente em mostrar o rosto de Irina nos momentos mais embaraçosos (ou divertidos) para o espectador voyeur, conseguindo assim extrair também intensa humanidade dos tipos que gravitam nesse mundinho, onde vigorariam os baixos instintos, embora eu ache que o imigrante Mikki (Miki Manojlovic), dono do estabelecimento e que começa a nutrir genuíno afeto pela vovó punheteira, seja um tanto bonzinho demais. Nada que atrapalhe esta agradável surpresa, no entanto. E chega de trocadilhos, por favor. Deixe isso para os distribuidores nacionais do filme e seus criativos títulos do tipo "Dando uma Mãozinha", "Em Tuas Mãos", "Nas Mãos de Irina", etc., etc.

quinta-feira, setembro 27, 2007

Os Protetores do Universo

(Shu shan zheng zhuan/Zu Warriors/The Legend of Zu, Hong Kong/China, 2001)



Não adianta. Tsui Hark, auteur de um dos filmes de ação mais legais de todos os tempos, O Tempo e a Maré (2000), não se dá bem com efeitos digitais. Nem com a Miramax, sobretudo. Os melhores confrontos de seus filmes são puramente físicos, como a espetacular perseguição de rapel em O Tempo, ou as piruetas de Jet Li sobre os ombros de seus oponentes em Era uma Vez na China (1991). Em momentos assim, sua câmera enlouquece. E as tramas de alguns de seus filmes, por demais complexas, quando não confusas mesmo, movendo-se sempre num ritmo acelerado, são ainda mais prejudicadas quando cortadas por imposição de produtores, como é o caso de Sete Espadas (2005). E como é o caso deste Os Protetores do Universo, que retoma o universo de seu clássico wuxia Zu: Warriors of the Magic Mountain (1982), baseado numa lenda "real", acrescida de efeitos digitais irreais, em uma narrativa truncada, obviamente encurtada por exigência da produtora Miramax para o mercado estrangeiro. O que resta é uma sucessão confusa de lutas típicas do universo wuxia, em que guerreiros voadores mitológicos, liderados pelo sábio Sobrancelhas Brancas (Sammo Hung), têm que unir suas espadas para enfrentar uma grande força maligna conhecida como Mordo, que está sugando a energia da montanha de Zu, de onde os guerreiros protetores tiram a força para combater as ameaças do mal. Uma confusão completa, apesar de algumas boas lutas coreografadas por Yuen Woo Ping (Matrix, Herói, O Tigre e o Dragão), quando os guerreiros de nomes Falcão, Lua ou Tempestade não estão voando diante de um cenário computadorizado, por exemplo, ou traindo uns aos outros sem maiores explicações, uma ou outra imagem bela (como a guerreira Lua se despedaçando) e Sammo Hung (o único remanescente do filme original), Ekin Cheng, Kelly Lin, Cecilia Cheung e a fofinha Zhang Ziyi perdidaços em meio às várias seqüências digitalizadas. Ao menos, não é tão ruim quanto o horrível A Promessa (2005), de Chen Kaige. Quem sabe numa versão estendida, quem sabe.

quarta-feira, setembro 26, 2007

Chegou!!!!!!



Exclamações, exclamações, à maneira do Michel Simões, hahaha, sempre serão poucas para expressar a minha alegria ao receber este presente que dei para mim, neste período de inferno astral, incertezas e absoluta indiferença cotidiana de algumas pessoas, inclusive das mais conhecidas. Enfim... Depois escreverei mais a respeito. Sobre o filme, não sobre a indiferença ou sobre as pessoas, está claro, pois não vale muito a pena perder tempo com certos tipos. Adianto apenas que só Lynch, da mesma forma que uma noite me fez acreditar estar vendo com meus próprios olhos vultos de anões andando pela casa à Twin Peaks, ou provocar genuínos arrepios toda vez que, zapeando, eu sintonizava algum canal fora do ar, à maneira de A Estrada Perdida, só mesmo esse meu xará bem mais conhecido e amado e odiado para provocar um cagaço daqueles em mim, tanto que o clima de pesadelo e ameaça que emana de suas imagens e personagens, filmados em close com uma grande angular, que deforma constantemente seus rostos, fez com que eu mesmo os revivesse em pesadelos noturnos que retomavam os mesmíssimos ambientes do filme. Ou seja, sem querer, consegui montar outro filme na minha cabeça, como Lynch teria gostado, hehehe. E sem o menor sentido também, mas tão assustador quanto. Sinistro! E como curiosidade, além de muitas e muitas cenas extras que poderiam ser encaixadas em qualquer outro lugar da narrativa, o DVD duplo, no começo, traz instruções para calibrar corretamente as cores da TV e assim apreciar nas devidas tonalidades este delírio sensorial de Lynch. Mas aqueles coelhinhos no começo, que medo!!! Luz acesa pelas próximas noites, búuuu.

Hairspray - Em Busca da Fama

(Hairspray, EUA, 2007)



Travolta, o astro de Nos Tempos da Brilhantina direto para os tempos do laquê ou do “Hairspray” nesta mais do que boa adaptação do musical da Broadway, que por sua vez, trilhando o mesmo caminho de Os Produtores, era uma derivação de um filme mais “certinho” do rei do mau-gosto dos anos 70, o inigualável John Waters (do ultrajante Pink Flamingos, Polyester e que aqui faz uma pontinha como um típico tarado exibicionista, logo no começo). Ao contrário das pálidas versões recentes para o cinema de outros espetáculos musicais contemporâneos (como os chochos e muito afetados Rent, em que todo mundo tinha Aids, Evita, O Fantasma da Ópera, Os Produtores, Dreamgirls...), este filme de Adam Shankman, evitando o escracho rasgado, consegue transpor para as telonas toda a vibração e energia dos palcos, proporcionadas principalmente pelas ótimas canções e pelas coreografias muito bem executadas, a cargo do próprio Shankman, ele mesmo um coreógrafo, na estória de uma animada gordinha adolescente de Baltimore, Tracy (Nikki Blonsky, que trabalhava numa sorveteria), que sonha em ser a estrela de TV do dançante programa local, The Corny Collins Show (“O Show Cafona de Collins”, vivido e apresentado por James Marsden). Sua mãe (o travestido John Travolta, no papel que foi do célebre travesti Divine no filme de Waters) é contra, até vê-la finalmente na TV, dançando como ninguém no programa de Collins, rompendo finalmente os padrões vigentes de beleza e estética e despertando, claro, a fúria da racista gerente da estação e ex-Miss Baltimore, Velma Von Tussle (a muito loira e ainda muito bela Michelle Pfeiffer), e de sua filha, Amber (Brittany Snow), até então a esbelta estrela do show e vencedora de todos os concursos de dança da rede de TV. Tracy também conquista para si as piscadelas do galã do programa, o então namoradinho de Amber Link Larkin (Zac Efron, de High School Musical). Como retaliação, Velma consegue cancelar o único dia do mês dedicado às danças e músicas negras, apresentado por Motormouth Maybell (Queen Latifah), além de fazer de tudo para boicotar Tracy, especialmente quando ela se envolve numa passeata na segregada Baltimore dos anos 60 em apoio aos negros, para quem ela deve muito do ritmo de suas dancinhas. Com a ajuda do pai liberal (Christopher Walken, divertido) e da cada vez mais dedicada mãe, dará um jeito de comparecer no estúdio de televisão para a final do concurso da Rainha do Hairspray e derrubar de vez as diferenças culturais, raciais, afetivas e estéticas, no triunfante gran finale, onde todos cantarão e dançarão ao som da sensacional "You Can’t Stop the Beat". Inclusive o muito à vontade Travolta, que faz um ótimo “par” romântico com Christopher Walken. Menos Pfeiffer, claro. Mas quem odeia musicais, quem odiou Chicago, por exemplo, mas cujo estilo minimalista brechtiano nada tem a ver com este colorido “Laquê” animado, ou prefere curtir samba ou sertanejo “de raízes” ou rock indie ou moda de viola das “nossas vastas solidões”, aviso: melhor passar longe, longe do filme, ou nem ler este texto (já leu mesmo, hahaha), pois em suas agitadas duas horas de duração todo o ótimo elenco nada mais faz do que cantar e chacoalhar os quadris ao som de um inspirado Rhythm and Blues e variações na querida e cafona Baltimore de Waters, onde os tipos provincianos fora do comum sempre prevalecerão.

E, especialmente para a Camila, o chacoalhante Gran Finale no ritmo de "You Can't Stop the Beat":
http://www.youtube.com/watch?v=9HtvO4-Y-x0

terça-feira, setembro 25, 2007

Rogue, O Assassino

(Rogue Assassin, EUA, 2007)



Menos pancadaria do que se poderia esperar de um confronto envolvendo dois grandes astros do gênero, como o lendário Jet Li (Era Uma Vez na China, Herói) e o carismático Jason Statham (Snatch, Adrenalina), pois quando existem seqüências de ação o videoclipeiro diretor Phillip G. Atwell, como Christopher Nolan em Batman Begins, dá uma de apressadinho na edição e suprime pontos importantes de uma correria pelos telhados, de um tiroteio num restaurante japonês ou de uma perseguição de carros, por exemplo, tornando tudo meio confuso quando o negócio é movimento. Ainda assim, a estória ganha notável importância e uma dramaticidade incomum para o gênero, e dessa forma assiste-se com interesse essa trama típica de vingança, em que um agente do FBI (Statham), após ver o parceiro e sua família serem brutalmente assassinados, fica obcecado em perseguir o responsável, o mitológico superassassino Rogue (Jet Li). Três anos depois, sua chance de dar o troco surge quando o matador reaparece, agora trabalhando para Chang (John Lone), o líder das tríades chinesas, e secretamente fustiga uma guerra entre Chang e Shiro (Ryo Ishibashi), chefe da Yakuza. Mas nem tudo é o que parece, conforme o filme faz questão de enfatizar em imagens mostrando espelhos estilhaçados à Dama de Xangai e máscaras desfiguradas, na inesperada reviravolta, onde Rogue e o agente do FBI demonstram ter mais afinidades entre si do que o espectador poderia imaginar. E Jason, quando não luta, atua bem. Além disso, o tipo ambíguo de Jet Li, armando inteligentemente para os dois lados, ao mesmo tempo em que se esquiva do FBI, serve bem para criar seu personagem “fantasmagórico”, ressurgindo inclusive do mundo dos mortos.

segunda-feira, setembro 24, 2007

Proustiano

Quando penso em Santiago, o requintado mordomo da família Salles que colecionava dinastias de "eras sobre eras" de antanho, vendo ou revivendo nelas um pouco ou muito também do seu passado, penso também em célebre frase de Proust, nas linhas finais de Em Busca do Tempo Perdido, que diz que os homens são "como seres gigantes mergulhados nos anos e tocam eles, simultaneamente, aqueles períodos de suas vidas separados por tantos dias – tão distanciados no Tempo". O Tempo, sempre ele, implacável. O Tempo, que você mata ou desperdiça se ocupando em pensamentos e na rotina dos tempos mortos do cotidiano com pessoas que nada têm a ver com você, é o mesmo Tempo que lhe enterrará um dia. E não há nada que se possa fazer a respeito. Nada. Entre o tic-tac das horas, a angústia, a indiferença. Tic-tac, tic-tac. O Tempo, o Tempo...

Ligeiramente Grávidos

(Knocked Up, EUA, 2007)



A grande sacada deste ótimo filme de Judd Apatow (do também ótimo O Virgem de 40 Anos) é fazer nos importar a cada minuto com os dois personagens principais, tão diferentes entre si, aparentemente tipos banais de comedinhas românticas insossas ou estereótipos de filmes de fraternidade, mas à medida que a projeção avança, vai além da superfície dos tipos retratados, moldando-os como seres de fato mais humanos, cheios de falhas, neuroses, graça, grosseria, alguma doçura e nenhuma afetação. E também fazer descobrir no diferente o quanto ele pode ser igual a você, mesmo sem nenhuma afinidade aparente.

Na trama, ele (Seth Rogen), um típico loser, feio, gordo, há anos sem trabalhar ou fazer qualquer coisa que preste, prefere passar o dia fumando maconha ou enchendo a cara na companhia dos amigos nerds, vivendo dos centavos que ainda recebe de uma indenização por um acidente sofrido há anos no Canadá. Ela (Katherine Heigl), loira, bela, com uma carreira promissora na televisão, mas que, numa noite de bebedeira, “se jogando numa balada”, para comemorar uma promoção, casualmente se aproxima dele, e a toda bem-sucedida e arrumadinha moça wasp acaba engravidando (“knocked up”) do judeu loser e desalinhado. Dois meses depois, se vê obrigada a se reaproximar dele, já que decide ter o filho, mesmo que isso ponha em risco a sua carreira, e a partir daí (e mais complicado) construir a improvável relação, cheia de rusgas, altos e baixos, mas de calor humano também. E as diferenças se mostram cada vez menores à medida que a relação vai naturalmente se construindo, ainda que com certos trancos, sem ilusões de príncipe encantado ou amor a primeira vista ou idealizações de uma família sentada na mesa como num comercial de Doriana, num filme longo, que é cheio de piadas grosseiras, sim, que muitas vezes apresenta situações comuns de comédias românticas também, mas que graças a Judd Apatow, às sacadas pop dos diálogos inteligentes e aos dois ótimos protagonistas, nos faz rir e chorar ou as duas coisas ao menos tempo, mesmo durante as suas irregulares e cheias de arestas duas horas e pouco de duração. E como bônus também há a ótima química entre Seth Rogen e Paul Rudd, aqui como o seu concunhado um tanto desiludido e se sentindo sufocado pela esposa controladora, coisa que as mulheres fazem muuuito bem, e que não deixam de repetir a hilária dupla de O Virgem de 40 Anos.

sexta-feira, setembro 21, 2007

"Passa a 12 aêeeeee..."

Na Folha de hoje, na coluna de Mônica Bergamo:

ESCONDIDINHO

Quem quiser ver o filme "Tropa de Elite" sem comprar DVD pirata tem uma opção: o filme estreou oficialmente - mas muuuuuito discretamente -num cinema de Jundiaí, no interior de SP, onde fica em cartaz até o dia 30. A estréia "escondida" foi feita para cumprir tabela: um longa só pode concorrer ao Oscar de melhor filme estrangeiro se já tiver sido exibido em circuito comercial até este mês. A estréia no país inteiro está prevista para 12 de outubro.

Serviço: para quem não agüenta esperar até o dia das criancinhas para ver o melhor filme brasileiro dos últimos anos nas telonas, Tropa de Elite entrou em cartaz no Maxi Shopping Jundiaí, numa única sessão, às 16h30.



"Homem de preto, qual é a sua missão? Entrar pela favela e deixar corpo no chão."

Querô

(Brasil, 2006)



Querô, baseado em livro de Plínio Marcos, é um retrato determinista, feio e sujo da infância perdida. Um órfão (Maxwell Nascimento), abandonado pela mãe prostituta (Maria Luísa Nascimento, mais uma vez interpretando uma desequilibrada), que é expulsa do bordel assim que o menino nasce, depois se matando ao ingerir querosene (daí o apelido “Querô”, que ele detesta), se vira crescendo na zona do cais do porto de Santos, fazendo bicos, cometendo pequenos delitos para sobreviver até ser pego e mandado para a Febem, onde, numa sucessão de infortúnios à brasileira, é estuprado, esfaqueia um monitor e foge de lá. Então, começa tudo de novo. Feio, sujo e direto, porém inconcluso, ainda que muito bem filmado, à maneira dos superestimados irmãos Dardenne, com câmera colada no rosto dos atores, o caminho trilhado pelo diretor Carlos Cortez a gente já conhece faz tempo (tipo o “soco no estômago da classe média culpada de cada dia”), embora ele evite o maniqueísmo ou o denuncismo fácil, típico de um Anjos do Sol, por exemplo. Bom, conciso, mas não comovente ou particularmente impactante.

quinta-feira, setembro 20, 2007

Os Mensageiros

(The Messengers, EUA, 2007)



Não achei ruim como andaram dizendo por aí este debut dos irmãos Pang (The Eye – A Herança, Visões, Assombração) em Hollywood, com produção da Ghost House de Sam Raimi (responsável por O Pesadelo e pelos remakes americanos de O Grito 1 e 2). Apesar do suspense não ser tão bem construído, reprisarem clichês de outros filmes e apelarem convenientemente para sustos fáceis, com os previsíveis sobressaltos provocados pela trilha sonora aumentada, deflagrada pela súbita aparição de um vulto qualquer, no entanto, como em Assombração, os Pang demonstram grande talento na construção de imagens ora oníricas, ora ameaçadoras, mesmo na estória manjada tipo Amityville de uma família endividada e em crise que se muda para uma casa cujos antigos membros desapareceram, conforme se anuncia no prólogo. O pai (Dylan McDermott), disposto a começar vida nova na fazenda, encara a realidade de plantador de girassóis como um desafio e com certo otimismo. Tanto que certa feita recusa uma oferta maior pela casa, oferecida pelo ator que costumava interpretar o "The Cigarrette-Smoking Man" na série Arquivo-X (William B. Davis). A filha adolescente (Kristen Stewart), obviamente rebelde, como um castigo. Porém, dia a dia, ela passa a notar vultos sinistros andando pela casa, que o seu irmão menor enxerga muito bem, em momentos que homenageam O Iluminado. E dá-lhe assombrações e espectros aparecendo e desaparecendo ou agarrando a menina no sótão ou chacolhando a casa inteira como em Poltergeist – O Fenômeno. E dá-lhe também o momento Os Pássaros nos corvos ameaçadores que constamentemente sobrevoam a casa e a plantação. Mas a ameaça é mais real do que a família imagina, vinda de um ser humano, porque o inferno está mesmo nas pessoas, sobretudo naquelas que se dizem tão simpáticas, amigas e cheias de conselhos de auto-ajuda para dar e vender, como constata a reviravolta final, já que, como estamos em Hollywood, há a necessidade de reviravolta, de explicação e de redenção para os protagonistas, e não de encerrá-los para sempre num mundo de onde não possam sair mais, como em Assombração. Apesar disso, vi este filme curto com interesse e admirando sobretudo cada minuto das suas belas composições visuais. Algumas, como os corvos sobrevoando a plantação de girassóis, não deixam de lembrar as famosas telas de Van Gogh.

quarta-feira, setembro 19, 2007

Os Protocolos de Sião

(The Protocols of Zion, EUA, 2004)



O infame panfleto de Os Protocolos dos Sábios de Sião, uma falsificação surgida na historicamente anti-semita Europa Oriental, redigido mais especificamente na Rússia do Czar Nicolau II, com seus notórios pogroms, e que acusava os judeus, como um grupo secreto tal como os maçons ou os Iluminatti, de perpetrarem uma conspiração mundial contra a humanidade por supostamente ocuparem postos-chaves na sociedade, ainda que a população judaica sempre fosse minoritária em qualquer país e seus representantes sempre excluídos da sociedade em geral, habitando guetos trancados a chave ou aldeotas (os "shtetles") isoladas e longe das grandes cidades, que ganhou vulto com o Caso Dreyfuss na França no final do século XIX e que serviu de base para as teses raciais dos nazistas para fazerem o que se sabe hoje em dia, embora muita gente ainda insista em negar, como o governo do Irã, ou diminuir o seu impacto, como muitos acadêmicos revisionistas e certos esquerdistas que acusam os EUA e Israel de todos os males do mundo. Ainda que desmascarado pelo jornal britânico London Times nos anos 20 ou banido da Alemanha depois do Holocausto, após o 11 de setembro, a absurda tese da conspiração judaica enunciada nos Protocolos parece ressurgir com força, junto com o antiamericanismo e o sentimento antiarábe, pois, entre outros disparates, como fotos forjadas e exercícios imbecis de numerologia, circulava o boato de que 4 mil judeus não teriam comparecido ao trabalho no World Trade Center no dia do atentado, o que ajudou a alimentar a tese de que o ato terrorista teria sido forjado e praticado por judeus para provocar uma guerra infinita contra os árabes, mesmo que assumido pela Al-Qaeda, nas próprias palavras de seu líder fundamentalista Osama Bin Laden. Fala sério!

Percorrendo as ruas, prisões, sinagogas, a comunidade árabe de Nova Jersey, seitas evangélicas, comparecendo na estréia do polêmico A Paixão de Cristo e entrevistando inclusive o líder de uma seita ariana baseada no interior dos EUA, que não acredita que Hitler tenha cometido suicídio, e conhecida por fornecer bandeiras, braçadeiras e botinas de solado com estampa de suásticas para grupos neonazistas da Europa, além de vender livremente pela Internet edições de Os Protocolos... e de Mein Kampf, o diretor Marc Levin demonstra o quanto essa centenária tese da conspiração judaica, a que hoje engloba ainda judeus donos de banco, de Hollywood e da mídia (mesmo que seu maior representante atual, o publisher Rupert Murdoch, seja um protestante branco australiano), se mostra arraigada na sociedade e na mídia “alternativa”, inclusive entre as minorias e mesmo entre as pessoas ditas mais esclarecidas. Mostra inclusive cenas de um ridículo especial da televisão egípcia, que “adaptou” as teses dos Protocolos na forma de uma minissérie exibida em horário nobre e que fez sucesso no mundo árabe, ainda que com dramaturgia capenga e tendenciosa. E conversa com o editor de um jornal de língua árabe de Nova Jersey, um palestino cheio de ódio contra Israel, que, após os atentados, fez questão de republicar nas páginas do diário todo o conteúdo dos Protocolos, embora negasse que a sua motivação fosse a de (re)alimentar o anti-semitismo. Também demonstra o quanto emerge de radicalismo nas opiniões dos jovens árabes americanos e de negros contra os judeus, que, segundo eles, também teriam sido os responsáveis diretos pela escravidão, entre outras coisas. Para um deles, até o ex-prefeito de Nova Iorque, católico, era judeu, por causa do nome Giuliani, que soava como “Jew-Liani”. É hilário, de provocar gargalhadas nos transeuntes. Mas também há aqueles que vão na contracorrente, mesmo estando entre radicais, tendo a coragem de divergir em meio aos coleguinhas mais exaltados. E, ainda, no melhor momento, entrevista um médico legista judeu, responsável pela identificação dos restos mortais das vítimas do atentado no WTC e que fala, comovido, como identificou seu amigo da sinagoga, que trabalhava no prédio no dia, por meio do DNA de um pedaço de osso, derrubando o mito da ausência de judeus mortos no atentado. Esse médico também mostra um freezer cheio de caixas com restos mortais ainda a serem identificados, o que retoma a Auschwitz e de como os seres humanos, por força de ideologias estúpidas, em que Deus nada tem ver com isso, são facilmente reduzidos a pó ou a pedaços de roupa e fragmentos orgânicos. Mesmo assim, certos mitos parecem resistir na cabeça dada a conspirações das pessoas, e a Internet é a ferramenta que mais contribui para disseminá-los, neste documentário ora puramente demonstrativo, ora irônico, entrecortado por trechos de filmes de propaganda nazista ou discursos anti-semitas de figurões como Henry Ford, entre outros, que tem como maior mérito deixar as pessoas retratadas falarem, exporem a sua ignorância em acaloradas discussões sobre teses conspiratórias em que o diretor em pessoa, ele mesmo de origem judaica, às vezes com a ajuda do pai, não deixa de intervir, se mostrar presente, dar a cara para bater, contra-argumentar e sobretudo registrar, sem ser invasivo estilo manipula-que-eu-gosto-alla-Michael Moore. E estendendo o exemplo, muito do que se vê neste filme também não difere muito do que ouvimos aqui no Bananão de representantes do governo petista esbravejando dia a dia contra a mídia “golpista” e “conspiratória”, mesmo que os fatos estejam aí para rebater os perdigotos. É mais uma vez hilário isso, de as coisas se repetirem e tal. Ou trágico, para não dizer patético.

PS: O lado ruim de fazer um texto assim é que vai ter uma porção de nazistinha entrando no meu blogue após digitar no "Guga" palavras como "protocolos", "sábios", "Sião" ou "Hitler" ou a combinação delas de uma vez. Mossad neles!

terça-feira, setembro 18, 2007

O Vigarista do Ano

(The Hoax, EUA, 2007)



Filme divertido, com toques dramáticos, dirigido com muita leveza e elegância por Lasse Halsström (dos ótimos Minha Vida de Cachorro, Gilbert Grape, Regras da Vida e Casanova) que conta a história (baseada em fatos reais) de como o escritor Clifford Irving (Richard Gere) armou e encenou uma fraude daquelas no mundo editorial nos EUA dos anos 70. Morando num bangalô com a mulher artista (Márcia Gay Harden), sem dinheiro e humilhado com a súbita recusa da poderosa editora McGraw-Hill em publicar o seu próximo livro, ele inventa, com a ajuda de seu amigo e pesquisador Dick Suskind (Alfred Molina, ótimo) ter sido convidado por Howard Hughes em pessoa para escrever a biografia do excêntrico milionário aviador, forjando memorandos escritos e assinados por Hughes, pelos quais consegue convencer a sua editora (Hope Davis) e todo o staff da McGraw-Hill e arrancar um bom adiantamento para levar adiante o “projeto”. Em seguida, algo semelhante é anunciado pela Time-Life e, aos poucos, a mentira vai ganhando ares de verdade e, sobretudo, notoriedade, e ele, com muita lábia e sangue frio, engana não só os editores, como o público, os jornalistas e até o governo do presidente Richard Nixon. Além de arrancar muito mais dinheiro, claro. Certa feita, com incrível cara-de-pau, capaz de deixar as mulheres da platéía furiosas, engana até a sua esposa, quando ela descobre seu affair com uma antiga paixão (Julie Delpy). Porém, em meio a inúmeras complicações em que vai se metendo e nelas se enrolando e cada vez mais obcecado com a história da figura retratada, ele mesmo vira uma espécie clone do paranóico Howard Hughes, neste filme que demonstra que a mentira, da mesma forma que em F for Fake, de Orson Welles, também é uma forma de arte, pois rende boas estórias, afinal escritor sempre tem que ter um pouco de mentiroso ou de “fingidor”, como diria Fernando Pessoa. Gere é aqui muito dos dois. E a excentricidade exacerbada do recluso Hughes, com suas manias vistas mais detidamente no subestimado O Aviador, de Martin Scorsese, torna-o sem dúvida um personagem mais estranho que a ficção. Em suma, bem agradável.

segunda-feira, setembro 17, 2007

Eu os declaro...



Não, mulheres, não precisam ficar desesperadas (ou aliviadas). Quem se casou no último sábado foi a minha irmãzinha Lílian, aí do meu lado. Eu apenas "entreguei" a noiva na bela cerimônia, que felizmente não teve nenhuma canção de O Fantasma da Ópera na trilha, muito menos A Marcha Nupcial. Só Black Sabbath e quejandos, pois meu cunhado é roqueiro! Mazel tov!

sexta-feira, setembro 14, 2007

Ele não desiste



Trailer de In the Name of the King: A Dungeon Siege Tale, a nova "obra-prima" do incansável Uwe Boll. Faz Eragon parecer um clássico. E repare na canastrice de dimensões shakespeareanas de Ray Liotta. Outrageous!

Deu Liga!

Joguem as flores, cruzem os arpões, abanem os lenços, rufem os tambores, soem as trombetas, acendam os canhões, os fogos, as velas, os traques, imaginem a cena com a fanfarra da 20th Century Fox (não com a Tocata e Fuga de Bach, hein!), pois é com muita satisfação que anuncio aqui, neste início do ano de 5768 (no calendário judaico, está claro, hehehe), a entrada deste glorioso Blog of Snobs na célebre Liga dos Blogues Cinematográficos. Mais do que a oportunidade, a honra e o privilégio de participar das periódicas votações promovidas pela democrática Liga, vejo a escolha do blogue sobretudo como um reconhecimento grandioso de todos que o elegeram para fazer parte de suas fileiras, ou melhor, de seus links. Nesse tempo em que insisti em manter o blogue no ar, procurando atualizá-lo sempre, mesmo em meio às dificuldades técnicas, financeiras, emocionais, gostaria de agradecer ao Ailton Monteiro, um dos mais fiéis leitores deste espaço, e sobretudo à Alessandra Marucci, que, apesar de tudo, foi decisiva em sua insistência diária há quase um ano para que, depois de tanto tempo só comentando em blogues alheios (e o Ailton sabe do que eu estou falando, hehehe), o esnobe Lorde David finalmente tivesse a sua própria página na rede dedicada a impressões sobre filmes, qualquer filme, qualquer gênero, sem "esnobismos". Muito obrigado mesmo a todos da Liga, particularmente ao Chico Fireman, que é um dos administradores da parada, e à Alê, em especial, um grande beijo, querida!



A reverência e a cerimônia do Capitão Ahab, da Liga dos Baleeiros de Nantucket, ao saber do resultado da votação da outra Liga antes de ser tragado para as profundezas do mar por Moby Dick. "Vai fundo", diria o capitão para Lorde David, antes de desaparecer com o seu navio.



Mais uma vez o olhar de felicidade difícil de esconder do Dr. House após a escolha.



E como diria o Hannibal, "saboreando" a definição do pleito: "Yummy!".

No Calor do Verão

(Camping Sauvage, França, 2005)



Acampamento de verão no litoral da França. Corpos expostos quase que o dia todo e desejos latentes vindo à tona, sobretudo os da loira Camille (Isild Le Besco), a bem fornida e entediada Lolita local, cujas lentes límpidas dos diretores Cristophe Ali e Nicolas Bolauri se enamoram dela desde os primeiros instantes. Com os hormônios exaltados típicos da juventude, aborrecida com o pai boçal, com a vida, com o universo e tudo o mais, ela não tira os olhos do taciturno Blaise, casado, pai de um filho pequeno, recém-chegado ao acampamento para ser o novo instrutor de vela, que não quer confusão e parece enfrentar problemas financeiros mal-explicados. Coitado! Entre olhares trocados, no entanto, e apesar de indiferente a ela, Blaise atrai os ciúmes do violento namorado dela e a ira dos familiares e acampados, liderados por seu cunhado, administrador do “recanto selvagem” e um tipo fascitóide até no bigodinho que usa. É expulso, mas foge de lá com Camille, sucumbindo ao desejo por ela, que é o desejo de todos os homens do camping. E o filme perde o pique. Apesar disso, é curto, concentrado em seus melhores momentos e trágico. Aliás, desnecessariamente trágico e com um ranço um tantinho moralista no desfecho, mas que tem a sua força, especialmente na interpretação estóica de Denis Lavant como Blaise.

quinta-feira, setembro 13, 2007

Eu os Declaro Marido e... Larry!

(I Now Pronounce You Chuck and Larry, EUA, 2007)



Incorreção política na primeira parte, mexendo com estereótipos e com a conhecida piadinha do sabonete caindo no piso do vestiário masculino em meio a um bando de machões despidos, aqui representada por um fortão Ving Rhames pra lá de desmunhecado, na estórinha farsesca de dois bombeiros nova-iorquinos, amigos de longa data. Um viúvo e pai de dois filhos, Larry (Kevin James); outro solteirão, misógino e mulherengo, Chuck (Adam Sandler). Como favor a Larry, que salvou-lhe a vida num incêndio, Chuck aceita trocar alianças com ele no cor-de-rosa Canadá para que Larry possa transferir para o outro, agora o seu parceiro legal, os benefícios do seguro de vida, o que garantirá, sob a s leis de Nova Iorque, alguma segurança para os filhos, caso morra na arriscada profissão. Era mais fácil se casar com outra lady novamente. Ou não, já que a mulherada de hoje em dia anda se fazendo de difícil. Mesmo assim, o fato é que esse casamento gay é uma fraude daquelas, o que forçará os dois machões a viverem sob o mesmo teto e a fingirem um novo modo de vida conjugal, a fim de não levantar maiores suspeitas na rígida administração da cidade de Nova Iorque, trazendo as conhecidas complicações de uma vida a dois. Uma advogada (Jessica Biel), defensora da causa gay, confiando na duvidosa honestidade de ambos, os assessora. E se deixa, claro, seduzir por Chuck. Então, na segunda parte dá-lhe correção política, com direito ao velho discurso de aceitação e aplausos dos colegas no tribunal, tudo bem antiquado, como nos tempos em que o “sr. Smith foi para Washington”. No meio disso, o humor, “machochô”, fica desequilibrado, neste filme um tanto longo de Dennis Dugan (O Pestinha, O Paizão, O Caquinha, O Merdinha...), apesar da simpatia de Kevin James, Sandler e da gostosíssima Jessica Biel. Mas, se não dá para matar de rir, coisa cada vez mais rara nas comédias americanas atuais, também não aborrece. Há, de fato, algumas piadas boas e uma tiradinha ótima, a cargo de Kevin James, quando os dois vão para a capela no Canadá se casar e prescindem da cerimônia religiosa, pois, além de mais cara, Larry é católico e “não quer ofender o Mel Gibson”, e boas participações de Dan Aykroyd, Steve Buscemi e de um embalsamado Richard Chamberlain, num roteiro que ainda contou com a assinatura do oscarizado Alexander Payne (Eleição, Sideways), vejam só. Mesmo assim, é muito prestígio para pouca graça.



Jessica Biel: um colírio!

quarta-feira, setembro 12, 2007

São Paulo 18%

Baixa umidade relativa do ar: sangramento do nariz, ressecamento dos cabelos até a raiz, olhos irritados, lábios ressecados, pele sequinha, sequinha. Cuidado!



MEIN GOTT!

Angela

(Itália, 2002)



A história supostamente real da bela Angela (a fraca Donatela Finochiaro), que trabalha na loja de calçados do marido, Saro (Mario Pupella), na verdade um negócio de fachada da máfia siciliana, sendo ela a encarregada de distribuir drogas em Palermo, acima de qualquer suspeita. Um dia, entre uma entrega e outra da mercadoria, que é enfiada nos sapatos para não levantar olhares desconfiados, ela se envolve num perigoso romance extraconjugal com o jovem intempestivo Masino (o boboca Andrea Di Stefano), recém-associado à quadrilha. Mas, desde o começo, a polícia está na escuta, acompanhando os passos de todos. Filme fraquíssimo, sobretudo porque em determinado momento a limitada diretora Roberta Torre, como típica mulherzinha, prefere se concentrar apenas no romance tolo entre Angela e Masino. Todo o resto, como os laços dela com a quadrilha desbaratada, passa a ser acessório, apequenando tudo, sem gerar grandes conflitos ou maior tensão que sustente o interesse, ainda mais em se tratando da brutal máfia siciliana. Uma pena, porque a recriação da atmosfera lúgubre das ruas da Palermo dos anos 80 é muito convincente, mas, em seu excesso de planos detalhes fúteis, o filme acaba ficando mesmo só na superfície do que é mostrado.

terça-feira, setembro 11, 2007

O Pequeno Italiano

(Italiannetz, Rússia, 2005)



Um pequeno órfão, Vanya, apelidado de “italiano” pelos colegas por ter sido “vendido” por uma esperta agenciadora de crianças a um casal obviamente de italianos, enquanto espera a adoção, foge do orfanato, onde também era explorado por valentões oportunistas, em busca da sua verdadeira mãe, no interior da Rússia. A empenhada jornada dickensiana deste “italianinho” cossaco do título, calcada em óbvias referências neo-realistas e iranianas pelo diretor Andrei Kravchuk, garante os momentos de maior frescor, interesse e aventura, ao percorrer uma Rússia desoladora e com instituições em frangalhos (bom, a Rússia sempre foi um lugar desolador, antes, durante ou depois do comunismo), na procura daquilo que poderia significar a sua redenção (e da Rússia até, como gostam de imaginar os cri-críticos metidos a sociólogos). Jornada redentora terminada em aberto, mas o suficiente para todas as senhoras e senhoritas mal-amadas exclamarem no final da sessão, diante do olhar infantil congelado do ator Kolya Spiridonov: “Ai, que fofo!”.

segunda-feira, setembro 10, 2007

Hora do Rush 3

(Rush Hour 3, EUA, 2007)



Chris Tucker, falastrão e inconveniente, de mais, Jackie Chan, velho e lento, de menos, além das ridículas participações de Max Von Sydow, como um ministro que combate as tríades chinesas na Europa, e Roman Polanski, como um comissário de polícia que apresenta aos nossos heróis a versão francesa do programa de “inclusão digital”, numa Paris feita basicamente de cartões-postais manjadíssimos e com cenas de ação para lá de rotineiras. Ou seja, tudo muito chato e chocho, à maneira de Brett Ratner, que nunca teve boa mão para a comédia. Nem para a ação, à exceção de X-Men 3. Deprimente.

quinta-feira, setembro 06, 2007

Macumba Sexual

(Espanha, 1981)



Um delírio macumbeiro-carnal, quase onanista no uso vai-e-vem-vem-e-vai que faz do zoom, do prolífico diretor Jesús Franco, que transforma o pesadelo de uma bem fornida corretora de imóveis (Lina Romay, mulher de Franco) num pretexto para a sucessão onírica de taras conduzidas pela princesa Obongo (a transexual Ajita Wilson) ou simplesmente “Tara”, que aparece para ela primeiro em sonhos alucinógenos, trajando em seu sexo um estranho amuleto, que mais se parece com uma vagina do avesso, para depois, com a intenção de espalhar o mal pelo mundo, materializar-se e atraí-la para seu resort nas ilhas Canárias, onde os quiosques e bangalôs lembram seios arrebitados, as dunas escondem amuletos fálicos e a câmera se demora sobre a paisagem no amplo uso que faz do CinemaScope. Depois, seu marido também será envolvido pela princesa. Além da farta exposição de genitálias femininas, marca do diretor, em devaneios eróticos (quase) explícitos, um clima de estranheza constante, confundindo alucinação com realidade como só o titio tarado Franco (que aparece num papel pequeno, como um recepcionista meio debilóide) sabia proporcionar. Ou seja, a estória aqui é o que menos conta. Serve para Franco imitar a si mesmo, como de costume, à maneira de Vampyros Lesbos, aproximando terror e sacanagem num clima surreal e explorando ao máximo o corpo de sua mulher, nua quase o tempo todo, aliás.



JESUS!!!

Luciano Pavarotti (1935-2007)



A mais solar das vozes italianas, aqui numa típica canção napolitana: Torna a Surriento, de Ernesto e Giambattista De Curtis. Nessa sua fase mais, digamos assim, "Benito Juarez", prefiria vê-lo entoando as boas e velhas cançonetas da terra do Vesúvio que cantando o pop do pop ao lado de malas como Bono ou Michael Bolton.

Encontros ao Acaso

(Come Early Morning, EUA, 2006)



A personagem da empreiteira provinciana, e um tanto casca grossa, (bem) interpretada por Ashley Judd, é uma vítima das desavenças de sua família de temperamento inconstante e, sobretudo, de si mesma, ao viver uma rotina de passar uma noite apenas com um sujeito diferente que encontra a cada noitada de sinuca, quadrilha e bebedeira nos bares de uma triste cidadezinha no interior do Arkansas. Uma noite, porém, depois de uma briga, conhece um bom sujeito, bom até demais, e as coisas parecem mudar. Aliás, os personagens masculinos são quase sempre inacreditavelmente simpáticos aqui, com uma ou outra exceção. No entanto, para ela que nunca gostou de compromissos, old habits really die hard.

Filme tristonho, tipo “independente” de espírito Sundance como tantos outros filmes passados no meio rural americano, infuso numa atmosfera melancólica que lembra muito a das películas dinamarquesas, e com um elenco de rostos conhecidos (Diane Ladd, Tim Blake Nelson, Stacy Keach) que garante certo interesse, nesta produção dirigida com modéstia, lentidão, mas com algum empenho pela atriz Joey Laurey Adams (Procura-se Amy), como demonstram as cenas da visita-surpresa de Ashley ao pai durante a noite, velho músico que se comunica essencialmente com a sua guitarra, e o melancólico plano final na varanda ao som de country music. Pois, no fim das contas, apesar de tudo e todos, sobretudo por causa de todos, está-se a só, a contemplar o pôr-do-sol na varanda, voltando para o mesmo ponto de partida, sem ter aprendido muita coisa, conformando-se aos velhos hábitos. E para as mulheres solitárias de trinta e poucos anos isso é ainda mais desesperador. Tadinhas!

quarta-feira, setembro 05, 2007

Paranóia

(Disturbia, EUA, 2007)



Depois de um breve e confuso final de semana resolvendo questões familiares e, sobretudo, político-marquetrefes envolvendo aquele tipo de favor que um dia acaba virando obrigação, e depois nem um “obrigado”, ainda mais em se tratando de política e outras coisinhas urgentes (e traumáticas), para a nossa gloriosa capital federal, a Versalhes tupiniquim de concreto do cerrado, a Brasília que rima com clamídia, excitadíssima que está com os preparativos e dizeres oficiais para um dos mais caros Sete de Setembro da história “deste paíz”, eis que acordo e retorno para repetir alguns breves chavões sobre este agradabilíssimo filme. Sim, eu sei, é o Janela Indiscreta teen e com aparatos de vigilância bem mais sofisticados na trama de um adolescente (Shia LaBeouf), carismático, em papel que reprisaria em Transformers) que, condenado justo nas férias de verão a ficar três meses recluso em casa por ter agredido o professor de Espanhol. Preso a um dispositivo eletrônico que limita seu raio de locomoção, descobre o tédio com a mãe viúva pegando no pé dele (Carrie-Anne Moss) e, sem iTunes, TV a cabo e Xbox on-line, passa a se entreter bisbilhotando os vizinhos e principalmente uma bela moradora (Sarah Roemer), recém-chegada à “Disturbia” dos subúrbios americanos. Nas tocaias que arma, desconfia que um deles, bem mulherengo (David Morse), possa ser um serial killer de primeira. Ou tudo não passaria da imaginação de sua mente adolescente e culpada pela morte acidental do pai?

Trama conhecida, mas não requentada pois bem amarrada pelo diretor D.J. Caruso (Roubando Vidas, 2004), que não consegue, no entanto, nos livrar da sensação de déjà vu no seu desfecho à Celular ou Quando um Estranho Chama, com os práticos utensílios domésticos aparecendo e servindo de arma ao heróico protagonista, mas que entretém e é melhor sobretudo na relação entre os adolescentes da vizinhança ou ao transmitir a sensação de confinamento do protagonista que no suspense, embora este renda boas seqüências, como a do supermercado ou a da invasão da garagem do vizinho suspeito pelo amigo oriental. E, logo no começo, ainda capricha nos sustos. Provavelmente um filme que reverei com prazer muitas e muitas vezes quando reprisar na TV. Agora deixa eu passar mais um tempinho internado sob os cuidados do Dr. House e suas píluas de sarcasmo até o trauma cívico passar, pois o Sete de Setembro taí, ó. Argh!