(Elementarenteilchen, Alemanha, 2006)
Um achado transpor da França para a Alemanha, terra do sexo comercializado livremente e padronizado em vitrines, clubes de prostituição, swing e sex shops, esta adaptação de consagrado e polêmico livro do francês Michel Houellebecq, que misturava sátira social e ficção científica. Ainda assim, germânica demais. Ou seja, correta, quadrada, sem grandes nuances ou lances de genialidade por parte do até competente diretor e também roteirista Oskar Roehler, relativamente fiel ao material original, com boa fotografia, belas mulheres e bons atores, dentre os quais se sobressai Moritz Bleibtreau (de Corra, Lola, Corra e A Experiência e ganhador, por este filme, do Urso de Prata de melhor ator na Berlinale do ano passado). Ele interpreta Bruno, professor de colégio que foi criado pela avó, longe do pai, decadente e alcóolatra cirurgião plástico, e da mãe, típica representante hiponga e libertária da geração de 68, aquela que dizia amar a humanidade embora detestasse o indivíduo (a não ser que esse indivíduo fosse um bandido ou um assassino, ou seja, uma “vítima” do sistema capitalista), devota da liberdade sexual e que corria o mundo em busca de diferentes parceiros e experiências místicas, comportamento errático elegantemente espinafrado por Houellebcq no livro. Quando a avó morre, Bruno vai para um internato, onde será hostilizado e seviciado e crescerá amargurado pelo abandono da mãe. Adulto, com pouco mais de 30 anos, é depois deixado pela esposa, que tira dele o filho pequeno. Constantemente deprimido, assedia suas belas alunas adolescentes e, depois, já separado, mergulha numa série de aventuras sexuais que lhe serão frustrantes até conhecer, numa colônia de naturismo e sexo tântrico, Christiane (Martina Gedeck), com quem passará a desfrutar uma vida a dois bastante aberta e libidinosa em boates e clubes de swing e sadomasoquismo. De escrita sangüínea, tenta também se tornar, sem sucesso, um escritor à direita, racista porque revoltado com negros bem-dotados e, por conseguinte, mais bem sucedidos no sexo e nas conquistas sexuais que ele. Já seu monástico e determinista meio-irmão, Michael (Christian Ullmen), também criado por outra avó e tendo passado grande parte da vida “dedicado a reflexões e devaneios solitários”, é um frio e renomado cientista que deixa o cargo de biólogo geneticista num instituto na Alemanha para, em meio às vacas na Irlanda, retomar antigas pesquisas suas sobre replicação do DNA e clonagem humana, um trabalho que vai mudar a história da humanidade e transcendê-la. Antes, ao retornar para a cidade natal para tratar da remoção do corpo da avó do cemitério local, outro cadáver reaparecerá, pois se reencontra com uma antiga paixão de infância, Annabelle (Franka Potente, a Lola corredora dos esvoaçantes cabelos vermelhos, aqui loiríssma), com quem retoma e aprofunda a relação, que terá também a sua carga de sofrimento, no entanto. No livro, as vidas opostas dos dois irmãos seguiam trajetórias paralelas, mas bem equilibradas entre si e de alguma forma se conectavam. Já o filme, pontuado por flashbacks, tende a se centrar mais no comportamento permissivo da sexualidade autodestrutiva de Bruno, tanto que o trabalho de Michael, que irá decretar o fim da reprodução humana sexuada, dando fim ao sexo como o conhecemos, pois para ele sexo e seus primitivos impulsos, instintivamente ligados a reprodução e perpetuação da espécie, é fonte eterna de angústias, privações, conflitos e sofrimentos, dos quais o seu irmão é um dos mais emblemáticos exemplos, é relegado a segundo plano ou a uma breve tela final explicativa. No livro, essa nova mudança de paradigmas engendrará uma mutação que não será mental, mas genética, em nível molecular, e o desfecho da obra, evocando o Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, é descrito em páginas das mais pungentes, cruéis e impactantes. Também na obra original, todas as provocativas digressões sociais, culturais e científicas que intercalam a narrativa, e são mantidas no filme aqui e ali na forma de diálogos menos inspirados e muitas vezes sentenciosos, são fascinantes. Aqui, o impacto final do livro acaba se diluindo em meio à resolução em aberto do drama familiar que, ao menos, é mostrado objetivamente, mantendo-se fiel à prosa sem floreios de Houellebecq, que dirige para este ano ainda uma espécie de continuação não-oficial deste Partículas..., intitulada A Possibilidade de Uma Ilha, também baseada em livro seu sobre a clonagem já estabelecida na Terra. É estranho voltar a Houellebecq bem neste momento, a todo o seu pessimismo mordaz e implacável contra a humanidade e a seus estúpidos "ceresumanos", mas reafirmo ser ele um dos autores essenciais para se compreender essa solidão devastadora de nossos tempos tão tecnologicamente avançados, mas que por algum motivo, biológico talvez, ainda nos faz reféns da ilusão amorosa, gerando alguma expectativa e depois mais solidão.
5 comentários:
descobri o seu blog pelo post do filme por gentileza com o auteuil. acabei de ver esse filme e adorei. ainda não falei dele no meu blog. beijos, pedrita
Oi, Pedrita. Obrigado pela visita e pelo comentário. Também me diverti bastante com Por Gentileza, sobretudo com a dupla de atores principais. Recomendo este Partículas também, especialmente o livro de Houellebecq, contra todo tipo de seitas, como complemento ao filme. Um beijo e apareça sempre.
Eu vi este com os meus pais. Não foi uma experiência boa.
Pensei: Moritz Bleibtreu, Elementarteilchen, Werner Heisenberg, warum nicht? Putz...
Warum nicht gut? Eu o revi com a minha mãe, aber sie schläfte, hehehe. Você é amiga do Carlos? Volte sempre. Um beijo.
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