sexta-feira, abril 04, 2008

O Banheiro do Papa

(El Baño del Papa, Uruguai/Brasil/França, 2007)




(Ou O Muambeiro Fiel.)

Pensando nas suas necessidades financeiras e, sobretudo, nas necessidades fisiológicas dos outros, Beto (César Troncoso), um muambeiro de Melo, Uruguai, que vive a penosa rotina de trazer diariamente em sua bicicleta produtos contrabandeados do Brasil para as vendinhas do povoado local e assim garantir parte do minguado sustento de sua muito pobre família, decide construir, sozinho, um banheiro para atender aos milhares de fiéis esperados durante a visita do Papa João Paulo II à região, em 1988. A fim de lucrar alguns trocados, todos os moradores também pretendem oferecer algum tipo de serviço aos esfomeados e sedentos visitantes que acorrerão ao local, vendendo lanches, quitutes, tortas e refrescos, empenhando suas parcas economias e até suas casas para armar as barracas e comprar lingüiça e pão. Muito pão. Tanta comida temperada que entra na boca dos fiéis uma hora deve ter de sair, raciocina o dedicado e engenhoso muambeiro Beto, com um tanto de ingenuidade, outro tanto de esperteza, daquela esperteza tão decantada pelos intelectuais e atribuída à sabedoria e criativdade das classes populares. Daí a idéia do banheiro. Começa então sua dura jornada para arranjar mais dinheiro e trazer na garupa de sua bicicleta desde a porta da toalete, encanamentos até o vaso sanitário, em momentos de humor e muita movimentação, enfrentando com algum jogo de cintura e muita teimosia os guardas de fronteira, a polícia, um fiscal aduaneiro que vive de achacá-lo e até a contrariedade da mulher e da filha.

Nem tão engraçado ou redentor quanto se poderia supor, já que o Papa acaba não sendo tão pop assim, o estreante diretor uruguaio César Charlone, em parceira com Enrique Fernández, emulando clássicos do neo-realismo italiano, iraniano, indiano, ucraniano, boliviano, etc., acaba na verdade prejudicando o bom potencial dessa história real que se quer singela com a sua intrinseca capacidade de filmar a pobreza dos hermanos daquele seu jeito tão brasileiro e comovido de retratar a miséria, visto nos filmes que fotografou e o consagrou, como Cidade de Deus e Jardineiro Fiel. O resultado, mediano, embora celebradíssimo pela crítica e pelo público chique, é acetinado, como as fotografias de Sebastião Salgado, e previsível, apesar da simpatia de seu esforçado protagonista, que conduz o filme. Ou seja, o que poderia ser uma revelação acaba sendo mais um típico representante latino-americano compromissado com as conhecidas mazelas de nosso continente, só que nos mesmos tons manjados e sem a mesma ironia dos filmes de pitoresca vila inglesa abalada com a chegada de algum visitante inusitado, como O Inglês que Subiu a Colina e Desceu a Montanha e O Barato de Grace.

5 comentários:

Anónimo disse...

Aprendam com este esnobe cavalheiro, crianças.

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Lorde David disse...

E pior que não espero nada muito diferente de Blindness, tão aguardado pela galera chique e culta, apesar do Ruffalo e da Julianne Moore.

Anónimo disse...

Os atributos do Meirelles tem sido, digamos, muito exagerados. E muita gente lá de fora comprou a idéia.

Lorde David disse...

Posso estar enganado, mas vejo o Meirelles cada vez mais como um novo Minghella, adaptando livros de autores de prestígio para buscar o reconhecimento de forma mais segura, da mesma forma que o Walter Salles. E pensar que ele tinha a idéía de rodar uma continuação de Intolerância, do Griffith. É muita pretensão.